TRANSPARÊNCIA NAS OSC E AS DECISÕES DO STF: A NOVA FRONTEIRA DA SUSTENTABILIDADE NO TERCEIRO SETOR

A transparência é a nova tendência e um caminho sem volta para garantir a sobrevivência das Organizações da Sociedade Civil (OSCs). Aqui na Associativa LGRC Consultoria, temos apontado essa direção há anos, alertando que a adoção de práticas transparentes não é apenas uma recomendação ética, mas uma exigência estratégica. Ainda assim, a publicação de relatórios, projetos, atas de assembleias, dados sobre arrecadação financeira, gastos e demais aspectos institucionais continua sendo um desafio para grande parte das OSCs no Brasil.

De fato, a regularidade jurídica e a transparência deixaram de ser apenas valores desejáveis: tornaram-se exigências normativas que impactam diretamente a atuação, a captação de recursos e até a sustentabilidade das organizações sem fins lucrativos. Desde a promulgação da Lei nº 13.019/2014, conhecida como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), e sua regulamentação pelo Decreto nº 8.726/2016, essas entidades passaram a operar sob um conjunto de diretrizes que visam garantir maior integridade, publicidade e controle social na execução de parcerias com o poder público.

O MROSC consolidou um novo paradigma institucional, exigindo das OSCs práticas administrativas e contábeis que assegurem não apenas a legalidade, mas também a legitimidade de sua atuação diante da sociedade. Trata-se de um marco que reposiciona o Terceiro Setor como ator estratégico na formulação e execução de políticas públicas, desde que fundado em bases sólidas de transparência e responsabilidade.

Essa questão ganhou ainda mais relevância ao ser objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em 3 de janeiro de 2025, os repasses foram suspensos para 13 entidades por falta de transparência, somando R$ 142 milhões em parcerias no âmbito federal. Os bloqueios ocorreram nas decisões recentes do STF (ADPF nº 854 e ADIs nº 7688, 7695 e 7697), após relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) apontar que metade das 26 entidades fiscalizadas não possuía mecanismos adequados para acompanhar a aplicação dos recursos.

Na época, aqui na Associativa LGRC já havíamos alertado que essa decisão não seria isolada. Inclusive, realizamos a Live das Emendas: O Terceiro Setor e as Decisões do STF, disponível neste link, onde antecipamos que a exigência de transparência avançaria para os demais entes federativos.

E foi exatamente o que aconteceu.

No dia 23 de outubro de 2025, o ministro Flávio Dino, no âmbito da ADPF 854, determinou que Estados, o Distrito Federal e os municípios devem urgentemente adotar medidas para garantir transparência e rastreabilidade aos recursos distribuídos por emendas parlamentares. Essa é a primeira vez que o STF estende a exigência de transparência para emendas estaduais, distritais e municipais, seguindo o modelo já aplicado às emendas federais desde agosto de 2024.

Importante destacar que essa decisão atendeu a um pedido de organizações da sociedade civil, como a Transparência Internacional – Brasil, a Transparência Brasil e a Associação Contas Abertas, que atuam como amici curiae na ADPF. Essas entidades apontaram que o modelo das emendas parlamentares federais vem sendo amplamente reproduzido por Estados e municípios, com níveis ainda mais baixos de transparência e rastreabilidade e altos riscos de corrupção, já evidenciados em escândalos recentes.

A decisão menciona dados do Índice de Transparência e Governança Pública, publicado pela Transparência Internacional – Brasil, que revelam um cenário preocupante:

  • Apenas 3 Estados oferecem ampla transparência às emendas parlamentares;
  • Entre os municípios avaliados, 122 de 329 prefeituras não disponibilizam qualquer informação sobre emendas parlamentares.

A partir de 1º de janeiro de 2026, a execução das emendas estaduais, distritais e municipais estará condicionada à adequação das leis locais às decisões já tomadas pelo STF para as emendas federais. Na prática, isso significa que todas as emendas parlamentares estarão sujeitas às mesmas regras, incluindo a exigência de plano de trabalho prévio, aprovação por órgão competente e publicidade dos nomes das empresas contratadas para execução de serviços e obras.

Durante a audiência no STF, o ministro Flávio Dino foi enfático:

“É impossível abrirmos um tapete gigante e colocarmos embaixo.”

Segundo ele, entre 35 mil e 40 mil emendas parlamentares executadas entre 2020 e 2024 não comprovaram o uso adequado dos recursos públicos. E completou:

“Não faz sentido que o dever de identificar a origem e os beneficiários finais dos recursos públicos se limite ao plano federal, permitindo que os mesmos vícios persistam nos níveis estadual, distrital e municipal.”

Além disso, o ministro garantiu que eventuais crimes em emendas Pix antigas serão apurados, reforçando o papel da Justiça e dos órgãos de controle federais na responsabilização por irregularidades.

Essas decisões representam um avanço institucional significativo e confirmam aquilo que temos defendido na Associativa LGRC: a transparência é uma tendência irreversível. Antes mesmo da decisão de janeiro, já alertávamos que mais cedo ou mais tarde haveria medidas mais eficazes e ostensivas de fiscalização. E agora, com a extensão das exigências para os entes subnacionais, temos convicção de que a transparência será exigida em outros tipos de gastos públicos e privados, inclusive em parcerias com OSCs.

Por isso, reforçamos: não espere a fiscalização bater à porta para começar a se adequar. A transparência precisa ser incorporada como valor organizacional, como estratégia de sustentabilidade e como instrumento de legitimidade social.

Se você ainda não assistiu, recomendamos a Live das Emendas: O Terceiro Setor e as Decisões do STF, disponível aqui, onde aprofundamos os impactos dessas decisões para as OSCs e apontamos caminhos práticos de adequação.

REFERÊNCIAS:

ASSOCIATIVA LGRC CONSULTORIA. Live das Emendas: O Terceiro Setor e as Decisões do STF. Instagram, 2025. Disponível em: https://www.instagram.com/p/DFbdLnGMsJi/. Acesso em: 04 nov. 2025.

BRASIL. Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014. Estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 jul. 2014. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/norma/584830/publicacao/15617411. Acesso em: 04 nov. 2025.

BRASIL. Decreto nº 8.726, de 27 de abril de 2016. Regulamenta a Lei nº 13.019/2014, que trata do regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 28 abr. 2016. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/decreto/d8726.htm. Acesso em: 04 nov. 2025.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF nº 854. Brasília, DF, 2025. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6828296. Acesso em: 04 nov. 2025.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 7688. Brasília, DF, 2025. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6828297. Acesso em: 04 nov. 2025.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 7695. Brasília, DF, 2025. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6828298. Acesso em: 04 nov. 2025.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 7697. Brasília, DF, 2025. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6828299. Acesso em: 04 nov. 2025.

LUSTOSA, José Patrício de Figueiredo. Feliz mundo novo: nas terras do Itaberabuçu, um verdadeiro tratado de ciência política. Belo Horizonte: Páginas Editora, 2021. 154 p.

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