De dois em dois anos somos cidadãos. Hoje, a “Festa da Cidadania”, onde todos os cidadãos exercem o direito universal do voto, é a Eleição. Escolhemos os nossos representantes que irão exercer o direito de elaborar, executar e fiscalizar as leis em nosso país. Sendo, na verdade, o dia em que exercemos a representatividade indireta na política. No dia da “Festa da Cidadania”, portanto, escolhemos os nossos representantes dentro do Sistema Partidário que irão exercer o poder político.
Por outro lado, o poder político do próprio ser cidadão poderia ser exercido de forma diferente no Sistema de Conselhos. A representatividade direta e o exercício pleno da cidadania, requer uma postura mais otimista e permanente do cidadão perante a vida e, portanto, uma atuação diária na fiscalização da efetividade das leis.
O Sistema de Conselhos proposto por Thommas Jefferson na Revolução Americana (América do Norte, em 1775 à 1783) seria capaz de manter o Estado interligado com a base da sociedade e com o cidadão participativo, mas essa noção de Sistema de Conselhos foi derrotada ideologicamente pelo Sistema Partidário.
Os Conselhos seriam estruturas regionais formadas pelos próprios cidadãos engajados que manteriam viva a ação revolucionária inerente de cada ser humano e a plena construção da ética coletiva.
“Ao estabelecer uma forte contraposição entre o Sistema de Conselhos e o Sistema Partidário da política representativa, Hannah Arendt não pretendeu simplesmente recusar os ganhos da democracia parlamentar, mas encontrar alternativas para redefini-la no sentido de preservar as pequenas “ilhas da liberdade” que os conselhos constituíram na modernidade e no mundo contemporâneo. Nessas condições, esses conselhos seriam a própria base de fundação de uma nova forma de governo, a verdadeira república, e da própria transformação possível do Estado a partir do fortalecimento dos princípios federativo e participativo (…). Não se trata de incluir todos diretamente, o que seria impossível, mas de multiplicar os espaços públicos a fim de que mais pessoas possam participar diretamente da política em diversos níveis”. (DUARTE, apud CARDOSO JUNIOR, Nerione Nunes, 2007, p.78)
Dessa forma, nos dias atuais, é importante darmos o valor e observarmos quando deparamos com a sensibilidade do Poder Público em incentivar a participação do cidadão nos Conselhos Locais, nas Organizações da Sociedade Civil e nas instâncias de representatividade direta. As agendas políticas dos administradores públicos e as decisões discricionárias da própria Administração Pública irão refletir no papel fomentador, ou não, do Estado na construção de posturas mais cidadãs.
Porém, a vontade em conquistar esses espaços de participação deverá nascer do próprio cidadão que passará a entender o seu papel no processo do desenvolvimento local integrado e sustentável de sua região. O amadurecimento do cidadão contemporâneo e das elites políticas brasileiras é de suma importância para a implantação de políticas públicas que objetivam o crescimento da organização da sociedade e do capital social promovido pela organização do povo e que preparará o cidadão para o engajamento político partidário ou não partidário.
Registra-se o amadurecimento dos espaços não partidários para a atuação direta do cidadão participativo. O Terceiro Setor sério e transparente cumpre o papel da Ágora contemporânea e convida para o exercício da cidadania de forma plena de duradoura, já que o controle social é função permanente dos cidadãos, que organizados, demonstram e estabelecem os limites éticos do desenvolvimento local e regional.
Mais do que uma alternativa ao sufrágio universal, o Terceiro Setor representa uma evolução da democracia, pois permite que o cidadão participe de forma contínua, ativa e colaborativa da vida pública. Enquanto o voto é um ato pontual, muitas vezes limitado à escolha entre opções previamente definidas, a atuação em organizações da sociedade civil permite a construção coletiva de soluções, o monitoramento constante das políticas públicas e a proposição de novas agendas sociais, ambientais, econômicas e até mesmo da realização coletiva da vontade dos seres que integram a sociedade.
Essas organizações da sociedade civil (OSC), assim chamadas, são espaços onde o cidadão deixa de ser apenas eleitor e passa a ser protagonista. Nelas, a democracia se realiza não apenas como sistema de escolha, mas como prática cotidiana de diálogo, escuta, cooperação e transformação. O Terceiro Setor, portanto, é o lugar onde a cidadania se organiza, se educa e se fortalece.
Ao promover a articulação entre diferentes atores sociais, o Terceiro Setor também contribui para a construção de redes de solidariedade e inovação democrática. Ele amplia os canais de participação e permite que grupos historicamente excluídos tenham voz ativa na formulação de propostas coletivas, hora similares, hora distintas do Primeiro e do Segundo Setor, mas sempre com recorte direto da vontade coletiva. Isto é, trata-se de uma forma de participação popular direta nas construções coletivas da sociedade, podendo inclusive fazer interlocução e parcerias com os demais setores. É muito mais do que representação política, é a elevação do cidadão à condição de ator na sociedade. Assim, a democracia deixa de ser um ritual eleitoral e passa a ser uma experiência viva, plural e transformadora.
Por isso, é fundamental que o cidadão compreenda que sua força não se limita ao voto, ou à eleição de um representante, mas, acima de tudo, à sua capacidade de se organizar, de propor, de fiscalizar e de construir coletivamente o bem comum.
REFERÊNCIAS
CARDOSO JUNIOR, Nerione Nunes. Hannah Arendt e o declínio da esfera pública. Brasília: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, Subsecretaria de Edições Técnicas. 2ª Edição, 2007.
LUSTOSA, José Patrício de Figueiredo. Feliz mundo novo: nas terras do Itaberabuçu, um verdadeiro tratado de ciência política. Belo Horizonte: Páginas Editora, 2021. 154 p.
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Bom texto. Boa reflexão!