RESUMO EXPANDIDO PUBLICADO NO ENCONTRO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA FACULDADE DE VIÇOSA (ENIC/FDV 2024), REALIZADO DURANTE A SEMANA NACIONAL DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA 2024, SOB ORIENTAÇÃO DA PROFESSORA ME. POLIANA AROEIRA BRAGA FERREIRA DUARTE. O TRABALHO INTEGRA OS ANAIS DO ENCONTRO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA FDV — PERIÓDICO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA REGISTRADO SOB ISSN 2527–1520 (ANAIS FDV 2024).
TEXTO ORIGINAL: https://www.fdvmg.edu.br/uploads/ENIC/Livros/Livro_Resumos_ENIC_FDV_2024.pdf
INTRODUÇÃO: O Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), estabelecido pela Lei nº 13.019/2014, determina as formas de parcerias que devem ser firmadas entre essas entidades e o Poder Público. A nova norma, além de estipular regras para o controle da parceria, também concedeu maior autonomia e possibilidades para que as organizações da sociedade civil (OSC) se tornem sustentáveis. No entanto, as OSC no Brasil têm enfrentado desafios significativos, decorrentes de interpretações equivocadas da legislação vigente por parte de gestores públicos e membros de conselhos de políticas públicas sugerindo que as OSC não podem realizar atividades comerciais, como a venda de bens e serviços.
OBJETIVOS: O presente trabalho tem como objetivo tecer uma breve análise sobre os problemas de interpretação em torno das normas que regem as OSC e os seus decorrentes efeitos.
ABORDAGEM METODOLÓGICA: Para o desenvolvimento do presente resumo, foi utilizado o método descritivo, com maior enfoque em revisão bibliográfica sobre o tema.
RESULTADO E DISCUSSÕES: O Código Civil Brasileiro em seu artigo 53 define que “Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos” (BRASIL, 2002). Não obstante, em seu artigo 54, IV, estabelece que o estatuto social de toda associação deve conter as fontes de recurso para manutenção das suas atividades e realização das suas finalidades. O termo escolhido pelo códex civil trouxe problemas interpretativos do que seriam os “fins não econômicos” previstos pelo legislador. A fim de trazer clareza ao tema, o Conselho da Justiça Federal definiu que “As associações podem desenvolver atividade econômica, desde que não haja finalidade lucrativa” (Enunciado nº 534, VI Jornada de Direito Civil — CJF/STJ). Tal entendimento também é abarcado pelo MROSC em seu Art. 2º, inciso I, alínea a. Todavia, o que se tem percebido é uma interpretação equivocada por parte dos gestores públicos e membros de conselhos de políticas públicas que, em vários casos, interpretam que as OSC não podem realizar atividade de cunho econômico, aduzindo assim que, uma vez realizada atividade econômica, afastado está o cunho social da atividade. Em pesquisa realizada pelo Grupo de Institutos Fundações e Empresas (GIFE), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), entrevistados evidenciaram situações em que o Poder Público “não assimila o serviço prestado como assistencial e necessário, mas, apenas, enquanto números a serem geridos” (GIFE, 2020, p. 113). Também fora relatado que “Na prática, gestores estariam mais preocupados em ‘cobrar por alguma coisa’, avaliando ‘coisas impertinentes’ porque, na verdade, ‘não sabem o que cobrar’ (GIFE, 2020, p. 113). Percebe-se, então que a aplicação da nova concepção jurídica em torno do terceiro setor está sendo “estrangulada […] pelos próprios gestores públicos” (GIFE, 2020, p. 122). A pesquisadora da FGV Direito SP, Aline Gonçalves de Souza, que conduziu o referido estudo, concluiu que “A falta de preparo e aderência à nova cultura finalística de controle, a ausência de uniformidade interpretativa, a ocorrência de alternâncias político-partidárias e de assimetrias quanto às capacidades nos diferentes níveis de governo seriam, todos, custos da transição, desafios de médio e longo prazo a ser superados” (FGV DIREITO SP, 2020, n/p).
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Para que o terceiro setor brasileiro alcance os fins por ele almejados, necessário se faz a capacitação, por meio de Programas de Capacitação previstos no Artigo 7º da Lei 13.019/2014, de gestores públicos, diretores de cartório e membros de conselhos de políticas pública, para atuarem em consonância com as disposições legais e entendimentos judiciais, de modo a salvaguardar os direitos das OSC, conferindo-lhes mais fontes de recursos e contornos, em benefício de toda a sociedade civil.
REFERÊNCIAS
ALVES, Aline; BONHO, Fabiana T. Contabilidade do terceiro setor. Porto Alegre: Sagah Educação, 2019.
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BRASIL. Decreto nº 8.726, de 27 De abril de 2016. Regulamenta a Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, para dispor sobre regras e procedimentos do regime jurídico das parcerias celebradas entre a administração pública federal e as organizações da sociedade civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/decreto/d8726.htm>. Acesso em 04/10/2024.
BRASIL. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em: 05/10/2024.
BRASIL. Lei nº 13.019 de 31 de julho de 2014. Estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação; define diretrizes para a política de fomento, de colaboração e de cooperação com organizações da sociedade civil; e altera as Leis nºs 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de março de 1999. Disponível em: <Lei 13.019/2014 https://legis.senado.leg.br/norma/584830/publicacao/15617411>. Acesso em 03/10/2024.
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VENOSA, Sílvio de Salvo; RODRIGUES, Cláudia. Código Civil interpretado. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2019.

